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Quaresma na Visão Espírita


Por: Rafaela Paes de Campos


O período da Quaresma inicia-se na quarta-feira de cinzas, logo após o feriado de Carnaval e estende-se até o chamado Domingo de Ramos, período, portanto, de quarenta dias, que representa a permanência de Jesus no deserto em estado meditativo a fim de se preparar para a sua vida pública. Muito embora o Espiritismo não celebre tais datas, ele respeita todas as manifestações, sendo que para a Igreja Católica é um tempo de preparo para a Páscoa, momento em que convida seus fiéis a meditar a praticar penitências com jejum, caridade e oração.


No entendimento Espírita, portanto, tem-se que a caridade e as orações devem ser parte constante da rotina do encarnado, bem como demais práticas que levem a reflexão espiritual e possíveis arrependimentos. Trata-se de prática da reforma íntima, que deve ser levada a sério por aquele que já compreende a realidade da vida imaterial e imortal, sendo este o caminho para que todos nós evoluamos do ponto de vista moral na escala dos Espíritos.


A Quaresma, portanto, tratando-se de tempo de privações e mortificações segundo a tradição, encontra explicações em O Livro dos Espíritos, em seu livro III, capítulo V intitulado Lei de Conservação.


De acordo com a questão 720, as privações voluntárias que têm como objetivo uma expiação coletiva, têm mérito aos olhos de Deus, pois trata-se de fazer o bem ao próximo. E continua aduzindo na questão 720a, que são meritórias as que tem como condão a privar-se de gozos inúteis desprendendo, assim, o homem da matéria a fim de eleva-lo enquanto Espírito. “Meritório é resistir à tentação que induz aos excessos ou ao gozo das coisas inúteis; é retirar de seu necessário para dar aos que não têm o suficiente. Se a privação não passa de um simulacro, é uma derrisão” (KARDEC, 2018, p. 238).


Assim sendo, compreendemos mais uma vez que o ato externo por si só não auxilia na depuração do Espírito, ou seja, se algo é feito apena para que cumpra com ‘obrigações’ impostas pela sociedade, sem que haja no íntimo a vontade sincera de que aquilo sirva como meio de melhorar-se, nada se alterará.


Quando despidos de nosso invólucro material, o que nos acompanha é apenas nossa consciência e verdadeiras intenções. Se nos privamos apenas por convenções, sem visar um bem maior, não há intenção real e, por isso, não haverá auxílio para que nos aprimoremos. A Quaresma é período simbólico da maneira pela qual devemos caminhar todos os dias de nossas vidas, sendo um rito, não um lugar onde se faz algo apenas enquanto durar a regra.

Sermos melhores, praticar a caridade e nos desvencilharmos daquilo que é puramente material é exercício diário – e não se diz fácil - mas necessário para que cheguemos à perfeição que todos nós almejamos enquanto Espíritos que somos.


Outra prática bastante comum durante esses quarenta dias é os fiéis absterem-se da ingestão de carne. Tal tradição surge na Idade Antiga consolidando-se na Idade Média, onde as desigualdades sociais eram gritantes e os menos abastados raramente ingeriam carne. Assim, ela tornou-se um símbolo de gula, eis que era servida nos grandes banquetes das cortes nobres. Sendo então considerada parte de um dos pecados capitais da Igreja, esta recomendava aos fiéis que não a ingerissem durante a Quaresma (FEAL, 2018, on-line).


Materialmente falando, há muito o que se discutir do ponto de vista ambiental quando o assunto é ingestão de proteínas animais, o que não é o cerne deste artigo, mas socorre-nos mais uma vez O Livro dos Espíritos na questão 723:


Para o homem, a alimentação animal é contrária à Lei da Natureza?

Em sua constituição física, a carne nutre a carne, do contrário, o homem perece. A lei de conservação torna um dever, para o homem, manter as energias e a saúde para o cumprimento da lei do trabalho. Portanto, ele deve alimentar-se segundo o que exige seu organismo (KARDEC, 2018, p. 238).


Recomenda-nos, assim, a Espiritualidade, que nos alimentemos daquilo que nosso corpo necessita. Todos, possivelmente, conhecem alguém que não consegue comer carne e, por isso, seu corpo não possui tal demanda e ele se abstém. Mas muitos ainda necessitam, e o Espiritismo não o proíbe ou julga como um erro. Se mencionarmos brevemente – embora não seja o objetivo – as citadas questões ambientais, claro que se conseguirmos nos privar da alimentação animal um ou mais dias da semana, é meritório (privação para o bem coletivo).


Entretanto, diferentemente do que se impõe na visão Católica, o Espiritismo não compreende que haverá depuração pela não ingestão de carne durante quarenta dias. O que nos depura é aquilo que verdadeiramente reside em nossos corações e se externa de forma racional visando o bem próprio e dos outros.


Claro que, muito embora o Espiritismo não possua ritos, se você é Espírita e precisa de um ritual a seguir, que assim seja! Entretanto, cuide para que o que faz materialmente seja real para ti internamente.


Se a Quaresma é período de introspecção e reflexão, que assim façamos igualmente em outros dias, buscando em nós mesmos os defeitos ainda enraizados e busquemos melhora-los todos os dias, até que os extirpemos de nossas personalidades e bagagens de tantas e tantas encarnações. Não são quarenta dias que nos tornarão mais próximos da perfeição, mas sim os nossos esforços diários, sem pressa, mas sempre com constância.

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Referências Bibliográficas:

FEAL. Quaresma e Espiritismo. Disponível em: https://tvmundomaior.com.br/quaresma-e-espiritismo/. Acesso em: 03 de janeiro de 2022.


KARDEC, Allan. O Livros Espíritos. Tradução e redação final de Matheus Rodrigues de Camargo. 23ª Reimpressão. Capivari-SP. Editora EME. 2018.


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